A Conferência das Nações Unidas Sobre o Comércio e Desenvolvimento (CNUCED; mais conhecida pela sigla UNCTAD para o termo em inglês) é um braço subsidiário das Nações Unidas para tratar principalmente de comércio e desenvolvimento. Além disso, abrange também assuntos como finanças, desenvolvimento sustentável, tecnologia e investimentos. O órgão foi estabelecido em 1964 e sua criação partiu das demandas de países com menores graus de desenvolvimento de ter o suporte de uma instituição internacional que fosse permanente para atender às suas necessidades e lacunas remanescentes de desenvolvimento para integração à economia mundial. Tal atuação se dá, principalmente, através de análises e assistência técnica
A UNCTAD foi criada no ano de 1964 em Genebra, na Suíça, na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas. O contexto em que se deu a conferência era marcado pela expansão das discussões sobre a liberalização do comércio internacional do GATT, com a intenção de promover uma maior integração entre os países em desenvolvimento na economia global.Inicialmente, a organização foi dividida em cinco comissões principais: produtos básicos, manufatura, financiamento, arranjos institucionais e problemas regionais. Estas comissões foram difíceis de ordenar já que, todos os países desejavam participar ativamente de todas. Nesta primeira Conferência foram determinados alguns âmbitos de acordo como: a expansão do comércio Sul-Sul; reformas das conferências marítimas (cooperando com países sem litoral) e propostas de Integração Regional entre os Estados. Contudo, todas essas questões eram secundárias, era prioridade da Conferência o estabelecimento de um programa futuro, onde a relação Norte-Sul se tornasse mais equilibrada.
Buscando apoiar os países em desenvolvimento no contexto da globalização, a UNCTAD os ajuda através da prestação de suporte para lidar com as possíveis desvantagens que podem eventualmente ocorrer em meio a integração econômica regional e/ou internacional. Entre os mecanismos utilizados pela organização para o exercício desta função está a realização de análises, a prestação de assistência técnica e formação de consensos.
Entre os objetivos estabelecidos pela organização, temos: compreender as opções para enfrentar os desafios de desenvolvimento em nível macro; alcançar uma integração benéfica no sistema de comércio internacional; diversificar as economias para torná-las menos dependentes de commodities; limitar sua exposição à volatilidade financeira e ao endividamento; atrair investimentos e torná-los mais favoráveis ao desenvolvimento; aumentar o acesso às tecnologias digitais; promover o empreendedorismo e a inovação; ajudar as empresas locais a subir nas cadeias de valor; acelerar o fluxo de mercadorias através das fronteiras; proteger os consumidores contra abusos; restringir os regulamentos que sufocam a concorrência; adaptar-se às mudanças climáticas e usar os recursos naturais de forma mais eficaz.
Durante sua criação em Genebra, em um contexto de debate acerca das políticas de liberalização comercial propostas pelo Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio e diante do quão prejudicados sentiam-se os países que não fizeram parte dessas negociações, o órgão passou a dedicar-se a promover a integração dos países em desenvolvimento nas discussões acerca de comércio e desenvolvimento internacional. Em suas primeiras décadas de operação, a UNCTAD atuou como um fórum intergovernamental para a promoção do diálogo Norte-Sul e negociações sobre questões de interesse dos países periféricos, visando enfrentar esses problemas e identificar ações internacionais apropriadas.
Após a primeira conferência foi decidido que o órgão se reuniria de quatro em quatro anos, com a presença de organismos intergovernamentais e um secretariado permanente responsável por prestar apoio caso necessário. Raúl Prebisch, após chefiar a Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe foi o escolhido para o cargo.
A história da UNCTAD, é dividida em três fases: Fase 1: Décadas de 1960 e 1970; Fase 2: Década de 1980 e Fase 3: Década de 1990 até os dias atuais. Durante a primeira fase (1960-1970), a UNCTAD ganhou espaço e notoriedade dentro do sistema internacional como um fórum intergovernamental para o diálogo Norte-Sul. Estes diálogos estavam atrelados aos interesses dos países em desenvolvimento e negociações associadas ao comércio internacional. Nesta época, a UNCTAD também é reconhecida por sua pesquisa analítica e assessoria política sobre as questões de desenvolvimento, e por debater sobre a “Nova Ordem Econômica Internacional” posta em discussão.
Na década de 1980 (Fase 2), houve uma transformação expressiva no pensamento econômico mundial. Fazendo com que o ambiente econômico e político se voltasse mais para o mercado, concentrando-se na liberalização do comércio e na privatização de empresas estatais. Por causa disso a década de 1980 ficou conhecida como a “década perdida”, principalmente para a América Latina e países em desenvolvimento, já que vários destes países entraram em graves crises de dívida. Apesar dos esforços dos programas de ajustes estruturais do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, a maioria dos países em desenvolvimento não conseguiu se recuperar rapidamente, experimentando o crescimento negativo e altas taxas de inflação. Devido a este cenário, a interdependência econômica no mundo aumentou.
A UNCTAD se deparou, contudo, com diversas transformações no sistema econômico internacional, motivadas principalmente pelo colapso de Bretton Woods e a disseminação das ideias neoliberais. Os debates passaram a ser voltados à liberalização do comércio e da privatização de empresas estatais, conjuntura que contribuiu para o agravamento da pobreza e a iminência de crises em inúmeros países em desenvolvimento. O cenário foi de crescimento negativo, altas taxas de inflação, e grande interdependência econômica no mundo.
A UNCTAD se esforçou para fortalecer o conteúdo analítico de seu debate intergovernamental (gestão macroeconômica, financeiras e monetárias internacionais), ampliando o escopo de suas atividades para auxiliar os países em desenvolvimento e sua integração ao sistema comercial mundial. A UNCTAD foi importante na Rodada Uruguai de negociações comerciais iniciada no âmbito do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) em 1986 e também desempenhou um papel fundamental no apoio às negociações do Acordo Geral sobre Comércio de Serviços (GATS). A UNCTAD também auxiliou os países no reescalonamento da dívida oficial nas negociações do Clube de Paris e contribuiu para permitir que as economias em desenvolvimento obtivessem maiores ganhos com o comércio, através do seu trabalho sobre eficiência comercial. Ainda, em 1989 entrou em vigor o Acordo sobre o Sistema Global de Preferências Comerciais entre Países em Desenvolvimento (GSTP). Uma cooperação Sul-Sul que previa a concessão de preferências tarifárias e não tarifárias entre seus membros.
Diante disso, a UNCTAD voltou-se a analisar o debate da gestão macroeconômica e às questões financeiras e monetárias internacionais, em prol de promover esforços para a integração dos países em desenvolvimento nesse sistema do comércio mundial. Em 1981, o órgão ajudou a organizar a primeira Conferência das Nações Unidas sobre os Países Menos Desenvolvidos. Poucos anos depois, em 1986, a UNCTAD ainda obteve importante participação na Rodada do Uruguai, a qual resultou no estabelecimento da Organização Mundial do Comércio. Outros marcos importantes são sua atuação quanto ao debate sobre eficiência comercial, suas negociações no Clube de Paris e o auxílio ao desenvolvimento do acordo sobre o Sistema Global de Preferências Comerciais entre Países em Desenvolvimento (GSTP) em 1989.
Na terceira fase (de 1990 aos dias atuais), a UNCTAD concentrou sua pesquisa analítica nas ligações entre comércio, investimento, tecnologia e desenvolvimento empresarial. Apresentou uma “agenda positiva” para os países em desenvolvimento nas negociações comerciais internacionais, destinada a ajudar os países a compreender a complexidade das negociações comerciais multilaterais e a formular suas posições, ampliou e diversificou sua assistência técnica, incluindo treinamento de negociadores comerciais e tratamento de questões relacionadas ao comércio; gestão da dívida, revisão das políticas de investimento e promoção do empreendedorismo; mercadorias; lei e política de concorrência; e comércio e meio ambiente.
Foi nesta fase que foi concluída a Rodada Uruguai de negociações comerciais no âmbito do GATT, que resultou no estabelecimento da Organização Mundial do Comércio em 1995. E também aconteceu em 2000 a décima conferência da UNCTAD, realizada em Bangkok, que adotou uma declaração política nomeada como “O Espírito de Bangkok”, como estratégia para abordar de maneira diferente os problemas dos países em desenvolvimento e a agenda de desenvolvimento do mundo globalizado.
O período de 2011-2020 foi de intensa adversidade, primeiro, devido às consequências da crise financeira global de 2008-2009; e em segundo, por conta da profunda recessão causada pela pandemia de COVID-19. Neste período, a organização havia se reorientado para um novo quadro de desenvolvimento centrado no desenvolvimento sustentável e concretizado através da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Em 2013 a UNCTAD completou 50 anos, e reafirmou sua missão de auxiliar os países periféricos a se posicionarem diante das disparidades e desequilíbrios de poder do sistema econômico internacional. Nos últimos anos, o órgão teve que lidar com as consequências deixadas pela crise financeira global de 2008-2009, além dos grandes desafios criados pelos debates acerca de segurança militar, mudanças climáticas, meio ambiente, desigualdade e pobreza.
O Acordo de Paris assinado em 2015 definiu o cenário para o apoio multilateral a uma agenda com foco no clima. Além disso, durante a segunda metade da década, o ambiente comercial foi alterado pela decisão do Reino Unido de deixar a União Europeia e pelas tensões comerciais entre a China e os Estados Unidos.
Em conjunto com outras agências das Nações Unidas, a UNCTAD também vem examinando o cumprimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, estabelecidos na Agenda de 2030. Além disso, em parceria com o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e a Organização Mundial do Comércio, o órgão suporta o estabelecimento do Financiamento para o Desenvolvimento, resultante da Agenda de Adis Abeba de 2015. Apesar de estar diretamente relacionada com a atuação dos Estados e governos, a UNCTAD também aposta na importância da cooperação privada e da sociedade civil para o desenvolvimento. Está atualmente presente em 195 países e oferece projeções para os níveis de comércio global.
Nos últimos dois anos a UNCTAD teve ainda que enfrentar um novo período de tensão devido à profunda recessão causada pela pandemia de COVID-19. Ademais, cabe por fim ressaltar que as mudanças enfrentadas na última década, frente às inovações tecnológicas e o aumento associado da mídia social, levaram ao fenômeno cada vez mais incidente da globalização e financeirização mundial. Em geral, a política global ficou marcada por um aumento do protecionismo, nacionalismo e extremismo de direita, o que provocou uma desconfiança em geral quanto ao sistema multilateral e certa reação popular contra a globalização. Para lidar com tais desafios, a UNCTAD busca delinear esforços para defender uma globalização mais inclusiva.
Desta forma, a UNCTAD continua se esforçando para “Defender uma globalização mais inclusiva e apontar a necessidade urgente de aumentar a capacidade produtiva, especialmente nos países menos desenvolvidos.”, alinhando a agenda econômica e comercial da UNCTAD com os esforços de desenvolvimento sustentável e os ODS. Apoiando os países na formulação de políticas para aumentar suas capacidades produtivas, aproveitando as oportunidades oferecidas pelo comércio eletrônico e novas tecnologias, e orientando contribuições para o fortalecimento do multilateralismo para o comércio e desenvolvimento, avanço da transformação estrutural, agora apoiado ao crescimento econômico sustentável.

Escrito por

Observatório de Regionalismo

O ODR (Observatório de Regionalismo) realiza entrevistas com autoridades em suas áreas de conhecimento e/ou atuação, lançando mão de diversas mídias à divulgação do material elaborado.