Imagem- Fonte: globalresearch.ca –

Nos últimos anos, mega-acordos regionais de comércio têm tomado forma e ganhado destaque no cenário internacional, tanto por sua dimensão e abrangência, quanto pela relevância econômica dos países envolvidos. Embora alguns se encontrem em fase de negociação, a existência de sua proposta denota uma tendência ao desenvolvimento de projetos de grande escala global, que poderia influenciar a maneira como o regionalismo e as transações comerciais são entendidas.

O primeiro processo a ser mencionado, o Acordo Trans-Pacífico, conhecido por sua sigla em inglês, TPP (Trans-Pacific Partnership), tem seu início em 2005, com um acordo inicial entre quatro países que compunham o chamado P4: Brunei, Chile, Nova Zelândia e Singapura. Tais países fazem parte da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, APEC (Asia-Pacific Economic Cooperation), processo regional iniciado no final dos anos 1980, e a proposta lançada pelos mesmos, inicialmente chamada de Acordo de Parceria Econômica Estratégica Trans-Pacífico, tinha por objetivo aprofundar as relações entre os sócios.

A partir de 2008 e até 2013, outros 8 países, Estados Unidos, Austrália, Vietnã, Peru, Malásia, México, Canadá e Japão decidem aderir ao bloco, compondo, juntamente com o P4, os 12 Estados-parte do acordo. A proposta promete, segundo o sumário disponibilizado na página do governo dos EUA, “promover o crescimento econômico; apoiar a criação e retenção de postos de trabalho; aumentar a inovação, a produtividade e a competitividade; elevar os padrões de vida; reduzir a pobreza em nossos países; e promover a transparência, a boa governança e o reforço das proteções do trabalho e do meio-ambiente“.

A abrangência do tratado promete ainda impactar o desenvolvimento das relações de comércio mundiais, uma vez que os países envolvidos representam 40% do PIB e cerca de um terço do comércio global. Para os estudos regionais, é interessante também notar que a concretização de um acordo como o TPP acabaria suplantando o existente Acordo de Livre Comércio da América do Norte – NAFTA – devido à participação de todos os membros e o seu maior potencial de liberalização. Além disso, o TPP reforça a ideia do Círculo do Pacífico, ou Pacific Rim, como região, ainda que exclua a geograficamente posicionada China.

A administração de Barack Obama empregou diversos esforços para a concretização do acordo, cujas negociações culminaram ao final do ano de 2015 e levaram à assinatura do tratado em fevereiro de 2016, devendo ainda serem ratificadas pelos países para sua entrada em vigor em até  dois anos (fevereiro de 2018), ou, após este prazo, depois da ratificação de pelo menos 6 países que representem 85% do PIB do bloco. Nas últimas semanas, no entanto, a eleição de Donald Trump vem questionando a viabilidade da concretização do acordo, uma vez que o futuro presidente prometeu tirar os EUA do TPP ainda em sua primeira semana de mandato. Após a manifestação de Trump, diversos sócios, como Japão e Austrália se manifestaram sobre a relevância dos EUA para a conclusão do acordo e o presidente Obama prometeu se manifestar diante da situação.

Os Estados Unidos participam ainda de outra negociação abrangente, que pode se ver ameaçada diante do protecionismo anunciado pelo seu novo governo, o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento, conhecido como TTIP (Transatlantic Trade and Investment Partnership), e negociado entre os EUA e a União Europeia. A estratégia do TTIP poderia ser considerada como complementar ao TPP, dadas as similaridades de ambos os acordos.

As negociações do TTIP foram anunciadas formalmente em 2013, após décadas de aproximação entre União Europeia e os EUA, que contam com a maior relação bilateral de comércio no mundo. No entanto, a previsão de que o acordo terminaria por sair em 2014 foram adiadas, diante da continuidade das rodadas de negociação. Juntos, EUA e UE simbolizam, em média, metade do PIB mundial e um terço dos fluxos de comércio, e, caso venha a se concretizar, será o maior acordo do tipo no globo.

Diante das novas tendências de mega-regionalização, que podem ou não se concretizarem nos próximos anos, cabe refletir acerca das implicações de um novo padrão de regionalismo amplo para os países não participantes destes acordos. Quais são as implicações para os países em desenvolvimento, como o Brasil? O que a formação de mega-acordos significa para os blocos regionais tradicionais existentes? A inserção internacional a partir dos blocos será entendida de uma nova maneira? A abrangência dos acordos poderia gerar uma alteração no sistema multilateral de comércio? Diante dos recentes comentários do presidente eleito dos EUA, é precipitado levantar expressar tais preocupações? A princípio, resta acompanhar e refletir e problematizar.

PARA MAIS INFORMAÇÃO (REFERÊNCIAS)

[UOL – Notícias] Obama alerta sobre se afastar de TPP e promete falar se Trump ameaçar valores

[European Commission]

[The Telegraph] What’s the difference between TTIP and TPP and why does Donald Trump want them scrapped?

[Terra – Notícias] Trump promete tirar EUA do TPP no primeiro dia no cargo

[Financial Post] Forget NAFTA, the TPP is the new ‘gold standard’ of global trade

[NY Times] This Was the Trans-Pacific Partnership

[US Trade Representative]

Escrito por

Clarissa Correa Neto Ribeiro

Doutora e mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas - Unesp, Unicamp, PUC SP. Bolsista CAPES, foi pesquisadora visitante no German Institute of Global and Area Studies - GIGA Hamburg, pelo Programa Doutorado Sanduíche no Exterior (CAPES PDSE) e realizou pelo Programa de Escala de Pos Grado da AUGM mobilidade acadêmica de mestrado junto a Universidad de la Republica (Uruguai). Graduada em Ciências do Estado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), foi bolsista de Iniciação Cientifica do CNPq. Membro da Rede de Pesquisa em Politica Externa e Regionalismo (REPRI) e do Observatório de Regionalismo (ODR). Interessada em pesquisas sobre regionalismo comparado, atualmente investiga as consequências da proliferação de instituições regionais na África e América do Sul.