Imagem- Fonte: El País –

A eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos em novembro passado aprofundou o cenário de incertezas na América Latina, em um contexto já marcado por crises econômicas e políticas. O discurso protecionista adotado por Trump durante a campanha eleitoral persiste, com a saída dos Estados Unidos do Trans-Pacific Partnership (TPP), acordo formado por 12 países do eixo Ásia-Pacífico e que fora assinado no governo de Barack Obama, além da promessa de renegociação do Nafta (North American Free Trade Agreement), acordo que o país possui com Canadá e México, em vigor desde 1994.

Diante da perspectiva de adoção de uma postura mais protecionista e voltada para assuntos internos pelos Estados Unidos, a América Latina parece buscar uma saída no fortalecimento dos laços regionais. Exemplo foi o compromisso estabelecido entre os países membros do Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai) e da Aliança do Pacífico (Chile, Colômbia, Peru e México) na reunião ministerial dos membros fundadores dos dois blocos no Fórum Econômico Mundial sobre a América Latina, que ocorreu em Buenos Aires no início de abril, com o objetivo de unir esforços para ampliação da integração comercial entre os blocos.

Tentativas anteriores de aproximação dos dois blocos[1] acabaram sem resultados expressivos, ainda que o tema continuasse presente no discurso diplomático dos seus membros (FUNAG, 2016)[2], motivado em grande parte pelos números positivos da economia dos países da Aliança do Pacífico – dados de 2015 apontam que a Aliança era responsável por 50% do volume total de exportações da América Latina, contra 37% do Mercosul (MENDONÇA, REBOSSIO, 2015)[3]. Para analistas, as divergências políticas entre os blocos foram o principal obstáculo para o sucesso dessa iniciativa, tendo em conta o caráter protecionista e politizado do Mercosul, em oposição ao modelo liberal da Aliança do Pacífico.

Contudo, a incerteza com relação aos Estados Unidos, aliada às mudanças políticas nas principais economias da região, como a eleição de Mauricio Macri na Argentina e o impeachment de Dilma Rousseff, seguido pela posse de Michel Temer no Brasil, ambos com propostas de retomada do modelo neoliberal e um discurso acerca da necessidade de reforma do Mercosul, levaram a um cenário favorável para a aproximação dos blocos. Presente no Fórum Econômico Mundial sobre a América Latina, o ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Pereira apontou que “depois de anos de desencontros, os líderes do Mercosul convergem acerca dos mesmos ideais de modernização e fortalecimento do bloco, ao estabelecerem agenda comum para uma inserção mais agressiva das economias dos sócios no mercado global”.[4]

Na mesma linha, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Aloysio Nunes, afirmou que “os vínculos entre Mercosul e Aliança do Pacífico se veem hoje fortalecidos por uma coincidência de visões entre os nossos governos, que compreendem que têm muito a ganhar com a convergência entre os dois blocos”[5]

Outro reflexo da chegada de Trump à presidência é a reaproximação do México dos demais países sul-americanos, por conta do desgaste das relações do país com os Estados Unidos e também como reação às ameaças protecionistas. O México foi um dos países mais afetados com o fracasso do TPP, tendo em vista sua dependência econômica das exportações, principalmente para os Estados Unidos. Para os mexicanos, o TPP representava uma grande oportunidade de abertura de mercados na Ásia. Também a perspectiva de renegociação do Nafta reforça a necessidade do país de diversificar suas parcerias[6]. Nesse sentido, intensificar o comércio inter-regional é um movimento defensivo em relação aos Estados Unidos[7].

Muitos avanços serão necessários para consolidar a parceria entre a Aliança do Pacífico e o Mercosul, já que, por exemplo, o comércio inter-regional na América Latina é muito baixo, em torno de 18% – para efeitos de comparação, o comércio inter-regional da União Europeia é de 69% e na Ásia de 55%[8]. Mas os sinais apontam que se o ciclo anterior do regionalismo na América do Sul foi marcado por instituições com foco na concertação política, como Unasul, Alba-TCP e o próprio Mercosul, a tendência atual é de retomada do caráter econômico e comercial como eixo do regionalismo.


PARA MAIS INFORMAÇÃO (REFERÊNCIAS)

[1] PORTAL BRASIL. Países iniciam integração da Aliança do Pacífico com o Mercosul. 04 nov. 2014.

[2] FUNAG. Repertório de Política Exterior (2015-2016).

[3] MENDONÇA, Heloísa, REBOSSIO, Alejandro. Mercosul abre pontes para acordo com a Aliança do Pacífico. El País 22 dez. 2015.

[4] MDIC. Mercosul assina acordo inédito para incentivar investimentos dentro do bloco. 07 abr. 2017.

[5] NUNES, Aloysio. Parceria para o Futuro. O Globo. 06 abr. 2017.

[6] STUENKEL, Oliver. Trump abre janela de oportunidade para maior integração na América Latina. El País. 13 fev. 2017. 

[7] MOLINA, Federico Rivas. Mercosul e Aliança do Pacífico se aliam contra o protecionismo de Trump. El País. 07 abr. 2017. 

[8] ZERO HORA. Mercosul e Aliança do Pacífico querem ampliar comércio na América do Sul. 07 abr. 2017.

Escrito por

Alyne Viana

Mestranda em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (Unesp - Unicamp - Puc-SP). Pesquisadora do Observatório de Regionalismo e integrante da Rede de Pesquisa em Política Externa e Regionalismo (REPRI). Bacharel em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Temas de interesse: integração regional, política externa brasileira, política externa norte-americana, grupos de interesse.