O processo de impeachment de Dilma Rousseff no Brasil tem sido alvo de especulações e prospecções nos últimos meses. Os rumos da política externa têm sido um dos tópicos mais comentados desde que José Serra assumiu o comando do Ministério das Relações Exteriores e, conjuntamente, pediu maior poder decisório na Apex (Agência de Promoção de Exportações) e na Camex (Câmara de Comércio Exterior). Já em sua posse, o chanceler fez questão de deixar claro que haveria uma mudança considerável na política externa brasileira e nas questões ligadas a integração regional.

Em seus primeiros dias à frente do Ministério das Relações Exteriores (MRE), o chanceler publicou nota rejeitando as declarações dos governos da Bolívia, Cuba, Nicarágua, Venezuela e Equador, assim como da Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América/Tratado de Comércio dos Povos (ALBA/TCP) e da União das Nações Sul Americanas (UNASUL) sustentando que o processo impeachment representa um rompimento da ordem democrática. E ainda, tanto a postura do secretário – geral da UNASUL, Ernesto Samper, a favor de Dilma Rousseff, como a presidência venezuelana no Mercosul, tem sido os principais desafios à política externa em âmbito regional.

Já no que se refere às novas diretrizes traçadas pelo chanceler, algo que tem sido enfatizado é a busca por uma política externa menos ideológica. Em sua primeira viagem ao exterior, José Serra visitou a Argentina sinalizando a sua demanda por parceiros sul- americanos com projetos de governo semelhantes. Nesse sentido a reorientação da política externa de ambos os países visa uma retomada aos moldes neoliberais, nos quais o Mercosul seria chave para a inserção comercial no mercado global, concentrando-se em objetivos econômicos e, desta forma, o caminho viável para dar dinamismo ao bloco seria uma maior flexibilização, o que permitiria acordos biliterais, sem que houvesse a necessidade de negociação conjunta, possibilitando aos seus membros superar um modelo limitado em suas negociações.

O chanceler brasileiro já afirmara que o formato atual do Mercosul representa uma renúncia à soberania da política comercial de seus membros e sempre demonstrou uma postura de ressalva ao bloco. Entretanto, desde que assumiu o MRE, Serra fez questão de deixar claro que não abandonará o Mercosul e ainda dará ênfase aos parceiros sul-americanos, porém, com a retomada dos parâmetros comerciais e buscando ampliar relações com parceiros tradicionais como Europa, Estados Unidos e Ásia.

Nesse sentido, a visita à Argentina e a busca pelo fortalecimento dessa relação refere-se à percepção de interesse de ambos em aprofundar relações com a Aliança do Pacífico (composta por Chile, Colômbia, México e Peru), as vistas no TPP (Tratado Transpacífico), projeto abrangente que reúne grandes potências e acesso direto a um dos maiores mercados mundiais, assim como demonstra maior empenho em concluir o acordo inter-regional com a União Europeia, o que sinaliza a busca por um novo fôlego no âmbito do Mercosul e também da região.

Portanto, é perceptível que os desafios são inúmeros, não somente no que se refere à crise política e econômica brasileira, em uma conjuntura internacional e regional menos próspera do que no início dos anos 2000. Esse cenário instável torna difícil a realização de prospecções de longo prazo, mas o que nos parece claro é que há uma mudança ideológica na política externa brasileira, na qual as parcerias políticas dão lugar a uma inserção internacional focada nas cadeias globais produtivas e comerciais.

Para mais informação (Referência):

AGÊNCIA BRASIL. José Serra rebate artigo do Financial Times sobre Mercosul.

BRASIL POST. Cotado para o Itamaraty, Serra considera Mercosul um delírio megalomaníaco .

CARTA CAPITAL. O impeachment e o realinhamento neoliberal na América Latina.

EL PAÍS. Serra enfrenta Mercosul dividido e limitações na agenda comercial.

EL PAIS.Argentina se volta para Aliança do Pacífico.

ÉPOCA. José Serra quer um novo Mercosul.

EXAME. Hermanos Outra vez- Mercosul ganha novo fôlego.

ISTOÉ. Serra se encontra com Tabaré Vázquez, no Uruguai, para discutir Mercosul.

ITAMARATY. Declaração do secretário geral da UNASUL sobre situação interna do Brasil.

ITAMARATY. Manifestações sobre a situação interna do Brasil.

Foto disponível na página do Itamaraty.

Escrito por

Alyne Viana

Mestranda em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (Unesp - Unicamp - Puc-SP). Pesquisadora do Observatório de Regionalismo e integrante da Rede de Pesquisa em Política Externa e Regionalismo (REPRI). Bacharel em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Temas de interesse: integração regional, política externa brasileira, política externa norte-americana, grupos de interesse.